O men que ghosteia
- Marina Soncini
- 25 de out. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 22 de nov. de 2023
Há uns três meses, em um role com as minhas amigas, brincando sobre que tipo de hétero básico cada uma seria, eu fui tirada para ser o men que ghosteia. Eu nem discuti, só ri. Eu realmente seria esse men. Rei do ignorar investidas indesejadas e, mais ainda, rei de deixar em visto em vez de comunicar (a falta de) interesses. Não sendo esse homem, mas ainda sendo essa mulher, há algumas semanas eu fui ghosteada. E foi um saco.
Sentir interesse físico-sexual por alguém, pra mim, não é tão incomum. Me atraio facilmente, gosto do flerte, me divirto e, se sou correspondida, sou boa jogadora. Mas até que ponto deve ir esse jogo? Ou melhor dizendo, quais responsabilidades eu tenho dentro dessas dinâmicas de conquista para, pelo menos tentar, que sejam saudáveis?
Por mais que eu me atraia facilmente e que goste da fase da conquista inicial, não é sempre que alguém me atiça para viver algo pra além do casual. Sentir vontade de falar, de reencontrar 3 minutos depois de se despedir e de compartilhar mais que 2h juntes não é algo que eu costumo sentir. E não acho que eu seja a única. Em geral, a vida de solteira tende a caminhar pela casualidade (seja isso bom ou ruim).
Eis que em um dia de semana, pra lá da meia-noite, eu tive vontade de não me despedir de um ser humano que eu conheci. E ele rapidamente demonstrou um interesse parecido. Saímos algumas vezes e era sempre muito intrigante pra mim a facilidade do não jogar, tipo: quer se ver hoje? Sim, quero muito. Hoje não posso. Almoçamos amanhã?
Eu não estou acostumada a nada disso, e mais rápido do que gostaria, eu me vi com vontade de continuar me envolvendo. Dias foram e vieram, até que em algum momento, meio do nada, eu não tive mais respostas. Respostas às mensagens mesmo, simples, cotidianas. Possivelmente eu estava levando um ghosting. E isso me doeu. E ok, não foi nenhuma tristeza absurda (também não vou exagerar no drama), mas foi minimamente chato.
Chato naquela vibe de estar vendo um filme e ficar pegando o celular de pouco em pouco tempo pra ver se por um milagre divino eu iria encontrar o sinalzinho de nova mensagem no Instagram. Às vezes eu encontrava, mas nunca era de quem eu queria. E convenhamos, que saco se encontrar nessa. A cada 10 minutos uma quebra de mini expectativa.
Entre isso e outras tantas vezes que pensei em subir uma foto só pra testar se a resposta viria, eu me senti tola. Mas também me perguntei: criei essa expectativa sozinha, ou to só sustentando uma ideia que foi sim plantada em conjunto, ainda que só com a sutileza do tempo compartilhado. Porque sinceramente eu não pensava em pedir ninguém em casamento, eu só queria sair pra comer no final de semana. E isso me parecia justificável para a dinâmica que acontecia. Eu não estava louca.
Nesse meio tempo, que durou algumas semanas, eu também parei de sentir vontade de sair com outra pessoa que saia antes, por motivos X. Depois de enrolar um tanto, já sabendo que não queria mais (e adivinhem fazendo o quê? Ignorando as mensagens que eu recebia), resolvi ser sincera. Escrevi uma mensagem (em inglês, pensa), mostrei pra umas três amigas, e dois dias depois enviei. A resposta veio muito rápida e tranquila. “Já imaginava, tudo bem, obrigada por tudo”. Que fácil! E ainda assim, por que foi tão difícil?
Tentar manter alguém que você sabe que não quer talvez nos dê uma sensação de estar menos sozinhas, de ser um pouco menos não-desejadas. Talvez a gente prefira a segurança de algo que não gosta do que a incerteza de se jogar em algo novo, porque o novo sempre vai trazer mais riscos. Mas convenhamos, preferir seguir tomando uma bebida que não se gosta, em vez de provar uma nova que pode te agradar, é uma verdadeira sacanagem com o nosso paladar, e é um absurdo pensar que fazemos isso com nossa vida amorosa.
Talvez, também, essa seja a melhor forma de demonstrar respeito pelos casos que nunca vingaram ou nunca vão vingar, e entender como eles podem ser o impulso na direção do que a gente realmente quer. Tomar as rédeas dos caminhos para os desejos pode ser, sim, assustador, porque você se torna o responsável pelo que se foi e pelo que vai vir. Livrar o(s) outre(s) da expectativa de uma mensagem que nunca vai chegar requer uma responsabilidade não só com o outre, mas com o teu próprio caminho.
E eu entendo que, em alguns momentos, ainda não exista aquela abertura do “o que você quer comigo" e "como você quer isso?”, ainda que seria o ideal desde o princípio. Mas também entendo que o espaço para o “não quero mais” deve estar sempre aberto, e deve ser utilizado sem muitas moderações quando for necessário. E podem dizer que só to escrevendo tudo isso porque me doeu um ghosting, tudo bem, é verdade mesmo.
Porque parte de ser adulto é absorver a ideia de que você não precisa estar cozinhando alguém pra ser válida ou pra se sentir desejada. E que ter o desejo de alguém que você não deseja, não vai manter sua autoestima em dia. Não vai te deixar feliz, não vai te fazer sentir menos sozinha. E obviamente, também não vai suprir a vontade de ser o foco do desejo de quem você realmente quer. Isso é uma ilusão, e não espanta nenhuma angústia.
Na verdade verdade, talvez também não mude nada pra você comunicar ou não um desinteresse. Mas pode mudar pro outre. Pode livrar de algumas expectativas e abrir espaço pro que pode ser algo real. Desobstruir o caminho mesmo. E de quebra ainda não ser um chato escroto (ou chata escrota, tipo eu). Oportunidade para ser adulte. Então assim, já tendo ghosteado muito, eu vou usar esse lembrete pra mim mesma, e reavaliar os não`s que eu deixo de dizer. Quem sabe assim eu posso evoluir para outro tipo de men hétero básico, e aí mudar o título desse texto para “O men que não mais ghosteia".







Comentários